quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Epístole

De: Um Poeta
Para: Fundo de gaveta empoeirado

Claramente uma brincadeira


“Então se vá, mas não me procure mais.” Redigi, eu, em tom jocoso*. Claramente uma brincadeira.
Mas é a claridade que cega o desavisado. Fôra eu, ferido pela elucidação de meus próprios simplórios vocábulos?
Seria esta colocação, um retrato de meu anseio em abominá-la? Que Ironia...
“Ah! Se ele tivesse vindo (o tamarindo)
Mas foi melhor que não viesse
Foi melhor, e a alma não erra
Porque para a alma exilada
É melhor nunca ver nada
Dos campos de sua terra
Ás vezes basta um flor
Para, repentinamente,
Assim como um ferro quente
Eternizar a dor”
Oh! Augusto dos Anjos... Até tu, Brutus? Meu deplorável ídolo... Antes o deus do indecoroso, hoje um mortal, meu igual...
Ridículo! Recomponha-te!
Sabes, leitor, afinal quero sim resigná-la. As estrelas mais brilhantes são as isoladas...
Deixa-me mundo, deixa-me agora! De companhia basta-me os livros.
Como a quero... a quero em demasia...
Cala-te a boca, idiota! Recomponha-te!
Vês? Estou dividido... Quero ao meu lado apenas a indiferença!
Mas é este impulso... Este ímpeto... faz tão bela a besta humana, vejo teus defeitos e os vejo tão belos!
Vejo tão cândido e macio corpo... e o desejo, sôfrego, tendendo ao frenesi... aqueles olhos penetrantes e líquidos, a tez branda, a voz cadente...E pensa, e como pensa, como é inteligente esta doce garota!
Cala-te, relapso! Recomponha-te!
Será isso o que chamam os néscios, “ser romântico”?
Pois não sou e não quero ser romântico... Tudo é matéria e tudo tende ao nada... beleza e inteligência de nada valem entregues ao tempo!
Se hoje, exalas doce aroma, amanhã, serás carne fétida, leitor!
Oh! Teleológica matéria, como é belo teu ofício, arruinar a ilusão humana. O homem é deplorável lixo vaidoso e inválido. Rezo a ti, Deus-Verme, faz me húmus, tira-me a dor de ser homem... burguês... branco... HOMEM! Ouve-me as preces, tira-me a ilusão da ternura, faz-me forte, impassível... faz-me ao menos burro, epilético, aliena-me do meu estado... faz-me irracional e joga-me ao ciclo biológico perfeito, onde o ser humano é o cancro.
Extingue esse cancro, Deus-Verme.

Faz-me qualquer coisa, mas faz-me outra coisa, tira-me a náusea da existência que o velho Sartre já cantou... Só não faz-me homem... HOMEM, NÃO... não mais serei humano, não quero... não quero! Mas... sim, eu quero... EU A QUERO!
CALA-TE A BOCA, IMBECIL... DE UMA VEZ POR TODAS! RECOMPONHA-TE!


Versos Subscritos


Junto à insônia vem a insânia
Desejo doudo de beber
E de amar





* Não existe tom jocoso na escrita... ela é por si só, reles instrumento, neutra e vaga. Fria companheira de madrugada.


Golfadas sinceras do bêbado
Elliot Santovich Scaramal

6 comentários:

Guilherme Toscano disse...

acho que você me entende, juba.

Anônimo disse...

Muito bom, muito bom...

Unknown disse...

o anônimo sabe oque diz x)

Andréa disse...

Não será ela merecedora de ler o que inspirou? Ah, sem delongas e romantismos, mas qualquer mortal ficaria de pernas trêmulas ao ler palavras assim dirigidas!
O amor tem fim em si próprio, não em ser retribuido.

Marra Signoreli disse...

acho que você me entende, juba. [2]

. disse...

muito bom mesmo =D